Transformação Digital e o impacto na indústria automobilística

As inovações tecnológicas decorrentes deste fenômeno global têm obrigado o setor a se reinventar. Quais os efeitos disso para o futuro das montadoras, cidades e das pessoas?

Transformação Digital e o impacto na indústria automobilística

O fechamento recente de fábricas de carros tradicionais no Brasil evidencia muito mais do que a drástica queda nas vendas, agravada pela pandemia, ou questões tributárias que envolvem o ambiente de negócios do País. O que está por trás é uma mudança de hábito das pessoas com relação a maneira de se deslocar pelas cidades, motivada pela chegada dos aplicativos de transporte, compartilhamento de veículos e pela facilitação do acesso ao transporte público – aspectos gerados pelo fenômeno da Transformação Digital.

É a partir da percepção criada por estas inovações tecnológicas que a **mobilidade passou a ser vista como um serviço**, não mais como bem de consumo. E isso tem gerado uma revolução não só na vida das pessoas, mas também na dinâmica das cidades e na economia.

A chegada ao Brasil dos aplicativos de transporte por geolocalização dos motoristas, em 2014, pode ser considerada um marco essencial neste processo. Foi graças a este tipo de serviço que os brasileiros passaram a contar com uma terceira via de locomoção, sem a necessidade de possuir um veículo. Deu tão certo que, em 2019, cerca de 71% dos brasileiros que têm smartphone já haviam solicitado ao menos uma corrida via aplicativo, segundo pesquisa do site Mobile Time. A empresa que lidera este segmento no País, por exemplo, acumula 22 milhões de usuários cadastrados e já realizou mais de 5,6 bilhões de viagens.

Os reflexos desta mudança de paradigma podem ser vistos nos dados do Departamento Nacional de Trânsito (Denatran). Estudo recente revelou que **a emissão de novas carteiras de habilitação no Brasil caiu aproximadamente 1/3** no final da década passada: de 2,9 milhões de documentos em 2014 para 2 milhões em 2018.

Especialmente entre os jovens até 25 anos, o desejo de poder dirigir o próprio carro perdeu espaço por conta não apenas das novas tecnologias, mas pelo alto custo do processo de obtenção da CNH, bem como de aquisição e manutenção dos veículos. Eles preferem usar o dinheiro para estudar, viajar ou consumir outros bens, como um smartphone novo.

MUDAR É PRECISO

Este novo **ecossistema de mobilidade pessoal**, composto de transporte por aplicativo, compartilhamento de veículos (carros, motos, bicicletas, patinetes) e propriamente a otimização dos serviços de transporte público, encurralou a indústria automobilística, que tem buscado a sua reinvenção.

Neste sentido, as gigantes do setor têm ido às compras, adquirindo desde startups de tecnologia e de micromobilidade à fabricantes de veículos elétricos, com o intuito de se inserirem neste novo contexto. No curto prazo, as montadoras também têm criado novas formas de vender carros em tempos onde as pessoas não precisam mais tanto deles.

No ano passado, por exemplo, marcas como as alemãs BMW e Audi lançaram no Brasil **programas de aquisição de carros por assinatura**. Mediante o pagamento de uma mensalidade, o cliente passa a ter direito a usufruir do veículo até o fim do contrato, quando deverá optar se o compra em definitivo ou devolve para a loja.

Para muitos especialistas, no entanto, nem mesmo estas acrobacias comerciais terão vida longa. Eles acreditam que o futuro das montadoras será mesmo a **produção de veículos com o propósito de atender as empresas de tecnologia** – perdendo por completo a conexão com o cliente final. Não à toa, na CES 2018, o presidente da Toyota, Akyo Toyoda, declarou que sua maior preocupação naquele momento era com as “big techs”, não com seus tradicionais concorrentes. O perigo, portanto, viria dos apps, não mais do chão da fábrica vizinha.

O EXEMPLO NÓRDICO

A chamada **’mobilidade como serviço’** (mobility as a service ou MaaS, na sigla em inglês) define a integração e análise de todas as formas de locomoção disponíveis em um trajeto, indicando as melhores combinações entre os modais conforme critérios como a óbvia fluidez, o conforto e o custo. Este conceito ganhou vida na Finlândia, onde a empresa MaaS Global criou uma plataforma digital que cumpre exatamente essa função.

Lançada em 2016, a plataforma funciona com um aplicativo que mapeia toda a capital Helsinki e arredores, conectando carros de aluguel, compartilhados, bicicletas, metrô e linhas de ônibus. Atualmente, cerca de 10 mil usuários utilizam o serviço todos os dias.

A partir dele, uma série de outras iniciativas foram desenvolvidas em países da Europa, Ásia, Oriente Médio e América do Norte. O propósito original se repete, mas há particularidades como **atendimento exclusivo para pessoas portadoras de deficiência física** ou, ainda, a conexão entre serviços mais sofisticados como incluir limousines de luxo no menu de opções do trajeto.

O QUE PODE MUDAR NAS CIDADES?

Extravagâncias à parte, há muitas outras medidas factíveis que podem colaborar com a expansão da mobilidade como serviço. Uma delas é a **melhoria do sistema de transporte coletivo das cidades**, permitindo que ele seja mais considerado pelo usuário na hora de definir a sua viagem.

Ações como **otimizar as estruturas viárias com faixas exclusivas para ônibus** e a aplicação de inteligência como a ferramenta Trancity, para gestão das frotas destes coletivos, podem adicionar um ganho exponencial de qualidade ao serviço, tornando-o mais ágil e seguro.

A Transformação Digital também tem estimulado o desenvolvimento destas cidades mais inteligentes, onde a **aplicação das soluções tecnológicas aceleram e facilitam a resolução de velhos problemas**, como os congestionamentos.

Dessa forma, o monitoramento de trânsito, da iluminação pública e de outros aspectos que possam dar mais eficiência à mobilidade urbana são medidas essenciais – e que carecem de **infraestruturas inteligentes de processamento para análise e integração de dados (IoC)** a fim de auxiliar o gestor público na sua tomada de decisão e implementação de estratégias.

Saiba mais sobre Cidades Inteligentes, suas Vantagens e Soluções. [Clique aqui](https://spoti.fi/39C8Bmx) e ouça o podcast no canal greenTALKS.

SER HUMANO NO CENTRO

Todas estas mudanças de comportamento, da infraestrutura das cidades e do modelo de negócios das empresas servem para atender a um anseio cada vez mais eloquente da sociedade atual: a de tornar as cidades mais *human centric* e menos focadas nas necessidades dos carros, motos e ônibus.

Espaços mais livres do trânsito de veículos, **mais amigáveis aos pedestres**, mais dispostos a facilitar a micromobilidade.

Apostando no crescimento do setor de mobilidade como serviço, a prefeitura de Helsinki pretende **eliminar a necessidade do veículo próprio** dos seus moradores até 2025. Uma meta tão ambiciosa quanto necessária.

Para um planeta que se prepara para ter cerca de 70% de sua população vivendo em áreas urbanas até 2050, segundo relatório da ONU, apostar em **soluções de mobilidade mais acessíveis, rápidas e econômicas** são fundamentais para imaginar um futuro mais eficiente e sustentável para as cidades.