O anúncio da chegada oficial do sinal de 5G ao Brasil, no dia 5 de julho, trouxe euforia não apenas aos usuários de telefonia, às empresas de telecomunicações e setores econômicos que serão fortemente beneficiados com a nova banda – como a indústria e a agricultura. Mais do que permitir acesso ultrarrápido a conteúdos digitais, impulsionar o caixa das companhias que venderão aparelhos e serviços, e conectar máquinas e sistemas que elevarão a produtividade de fábricas e fazendas, a estreia do 5G deve destravar o desenvolvimento de aplicações e ferramentas tecnológicas que serão essenciais para a construção de cidades mais inteligentes.
Com a banda de alta velocidade, tecnologias emergentes como a internet das coisas (IoT), inteligência artificial (AI) e machine learning (ML) passam a ganhar escala de usabilidade nos ambientes urbanos. Será a partir dos dados coletados, processados e analisados que os gestores públicos poderão tomar decisões mais assertivas e elaborar políticas públicas mais eficientes para enfrentar os desafios e proporcionar mais qualidade de vida à população.
Contudo, as vantagens disruptivas destas inovações, agora impulsionadas pelo 5G, só serão devidamente aproveitadas com o protagonismo de uma outra tecnologia: o edge computing. O processamento distribuído e próximo das fontes geradoras de dados será fundamental para reduzir o tempo de resposta diante das demandas relacionadas à segurança, mobilidade, saúde e preservação do meio ambiente nas cidades.
Assim, arquiteturas de sensores conectados à internet (IoT), câmeras inteligentes e sistemas com aprendizado de máquina só alcançarão o êxito esperado de suas propostas de uso se tiverem os dados que emitem devidamente processados no edge, em tempo real e com a mais baixa latência possível.
Edge intelligence
Gerar inteligência a partir da borda é, portanto, crucial para que a consciência situacional produzida pelo ecossistema digital implantado na infraestrutura das cidades possa cumprir a sua missão de melhorar serviços e oferecer uma vida mais saudável e segura nos centros urbanos.
Ao redor do mundo, o edge intelligence já é percebido em edifícios públicos onde, para dar mais eficiência aos sistemas de iluminação e ventilação dos ambientes, os dispositivos de processamento distribuído alertam quanto ao desperdício de energia elétrica ou acúmulo excessivo de partículas nocivas à saúde no ar, como pode ocorrer em estacionamentos subterrâneos ou corredores de hospitais.
Na questão dos resíduos sólidos, este recurso pode acionar automaticamente o serviço de coleta de lixo municipal ao “compreender” quais e quantas lixeiras públicas encontram-se lotadas naquele momento. Além de ofertar mais agilidade, a solução incentiva a sustentabilidade, uma vez que os veículos de remoção das lixeiras passam a circular apenas quando estritamente necessários, diminuindo a emissão de carbono da frota.
No gerenciamento do tráfego, a parceria de IoT, AI e ML com o edge é a mais evidente. A integração de dados e imagens coletadas da malha viária são processadas localmente e fornecem respostas rápidas para redirecionar o fluxo de veículos. Na cidade de São Paulo, um projeto piloto neste sentido está sendo desenvolvido pelo Laboratório de Sistemas Integráveis Tecnológico (LSI-TEC) e a Universidade de São Paulo (USP). No campus da Cidade Universitária, zona oeste da capital, dois projetos-piloto com sensores de IoT implantados em veículos e semáforos, suportados por edge, estão sendo conduzidos na busca por mensurar os reais benefícios de uma solução integrada como esta para mitigar os efeitos negativos do tráfego pesado da cidade.
SAIBA MAIS: Benefícios e vantagens do uso de computação de borda
Em um passo mais adiante, a inteligência obtida na borda permitirá a unificação de sistemas que viabilizará a tão esperada mobilidade autônoma. Uma vez implementada, a rede distribuída garantirá um processamento contínuo dos dados gerados no diálogo entre veículos sem motorista e a infraestrutura viária. Isso não apenas promoverá uma fluidez mais segura, como será essencial em ocorrências de acidentes – onde o edge intelligence se encarregará de acionar as equipes de socorristas, avisar o hospital mais próximo para atender as vítimas e reorientar o trânsito no local.
Infraestruturas dedicadas de edge computing podem garantir mais resiliência a bairros e localidades, por reduzirem a dependência de prestadores de serviços de análise e armazenamento de dados terceirizados. Em Dubai (UAE), a incorporadora Paradise Hills lançou em março deste ano o primeiro condomínio multiúso com provedor de internet e edge computing próprios. No total, 170 edificações contarão com suas unidades exclusivas de conexão à rede, storage e de processamento na borda. Além de prover mais segurança ao dono das informações, confere mais disponibilidade de acesso à rede e diminui os custos associados à contratação caso fosse terceirizado. Comerciantes locais também poderão abater parte de seus gastos operacionais ao aderirem à rede do empreendimento.
Outra vantagem de um ecossistema integrado e múltiplo com edge computing é a sua robustez e segurança ante ameaças externas. Uma vez conectados e integrados, os dispositivos de processamento na borda podem cooperar entre si – em ação conhecida como “rede enxame” –, compartilhando dados e configurações que garantam a continuidade do seu funcionamento, mesmo sob ataque.
Foco em mobilidade e segurança
No Brasil, o Governo Federal instituiu em junho de 2019 o Plano Nacional de Internet das Coisas, cuja finalidade é desenvolver o IoT no país, visando melhorar a qualidade de vida das pessoas e promover ganhos de eficiência nos serviços públicos por meio da implementação de soluções orientadas por dados.
Dentre as ações propostas no documento está a Cartilha de Cidades, que traz orientações e recomendações para os administradores públicos interessados em incorporar soluções de tecnologia em suas gestões. O documento tem como focos prioritários a mobilidade urbana e a segurança pública, sinaliza os principais desafios, sugere um passo a passo para a implementação do IoT e elenca uma série de casos de sucesso já consolidados em cidades como São José dos Campos (SP), Belo Horizonte (MG), Fortaleza (CE) e Rio de Janeiro (RJ).
Dentre os cases internacionais mencionados na cartilha, vale destacar o de Copenhague, na Dinamarca, cujo sistema semafórico inteligente prioriza o tráfego de bicicletas – 40% dos moradores da cidade utilizam este meio de transporte diariamente; e da cidade chinesa de Sichuan, que conta desde 2017 com um ecossistema de segurança inteligente para alertar com antecedência de cerca de um minuto quanto a eventuais abalos sísmicos que possam atingir a região.
Consciência urbana digital
À medida que avança o desenvolvimento de novas soluções aplicáveis às cidades, especialistas sinalizam quanto a uma possível criação de uma consciência urbana digital, baseada no legado que estas tecnologias disruptivas podem deixar com o passar dos anos.
Tendências populacionais, demandas frequentes, comportamentos sazonais, consumo de recursos, tudo poderá ser modulado e antecipado a partir deste know-how adquirido sobre como determinada cidade funciona.
A construção deste conhecimento passa também pela adotar soluções tecnológicas capazes de realizar um monitoramento contínuo e preciso, bairro a bairro, rua a rua, de todo o ambiente urbano. Ferramentas que forneçam uma visão crítica sobre todo o território, colaborando com o gestor público na tomada de decisão que maximize o impacto dos seus investimentos.
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Cidades que implementam estratégias baseadas em dados para transformar as suas operações cotidianas e solucionar problemas tendem a acelerar o seu crescimento econômico e social, eliminando os obstáculos que atrapalham a sua prosperidade. Juntas, podem formar um ecossistema integrado, que facilite a troca de informações, experiências e práticas em prol do bem coletivo. Para tanto, administradores públicos devem investir na capacitação de profissionais aptos a pensar o futuro data driven da cidade. Precisam também incentivar o alinhamento do trabalho de urbanistas e desenvolvedores de soluções disruptivas, para que a transformação seja planejada simultaneamente no campo físico e tecnológico, com seus efeitos distribuídos no longo prazo.
Importante compreender, por fim, que as cidades mais inteligentes também geram mais dados. Arquiteturas de IoT, sistemas inteligentes de câmeras e redes de edge computing demandam capacidade computacional, consumo eficiente de energia e infraestruturas de TI mais robustas, seguras e disponíveis. Portanto, as cidades carecem de esforços e investimentos hoje, a fim de se tornarem mais inclusivas, resilientes, justas e sustentáveis no futuro.